terça-feira, 14 de janeiro de 2014

O tema do sofrimento

Se algum dia você já se perguntou "porquê sofremos?", provavelmente isso se deu em uma momento duro de sua vida. De fato, no fundo de cada sofrimento experimentado pelo homem, como também na base de todo o mundo dos sofrimentos, aparece inevitavelmente a pergunta: porquê? 

O Papa João Paulo II, em sua carta Salvifici Doloris, salienta que "[O tema do sofrimento] acompanha o homem em todos os quadrantes da longitude e da latitude terrestre; num certo sentido, coexiste com ele no mundo; e por isso, exige ser constantemente retomado".

Mas, se você procura no mundo a resposta de porque sofremos, voltará de mãos vazias. O mundo não pode te dar nenhuma razão para o nosso sofrimento. Se realmente queremos conhecer a verdade, não podemos nos negar a enfrentarmos a verdade como ela é; não podemos nos negar a enxergar uma das verdades mais elementares e poderosas da nossa fé: o fato de que é o próprio Deus quem permite o sofrimento.

Podemos dizer que Deus exerce Sua vontade basicamente de duas maneira: vontade soberana e vontade permissiva.

A vontade soberana de Deus é sua vontade perfeita. Deus criou o céu e a terra, te criou e fez com que você nascesse. A vontade soberana de Deus se exprime pelo Seu plano para os homens e não muda jamais. 

Mas, ao longo de nossas vidas, milhões de fatores (os atos dos demais, circunstâncias externas, a economia, a natureza, a vontade satânica) nos expõem a um sem-fim de possibilidades. Essas possibilidades , nas quais podemos incluir nossas dores e sofrimentos, são permitidas por Deus que, dessa forma, exprime Sua vontade permissiva.

Sempre é importante lembrarmos que, diferentemente do que o mundo quer que acreditemos, não fomos feitos para a felicidade aqui na terra. Não importa o quando buscamos, nunca seremos completamente felizes e completamente realizados na nossa vida terrena. Pelo contrário! Fomos feitos para a santidade. E isso inclui estar sujeito a diversos sofrimentos que Deus, de uma maneira que só Ele entende e que nós só compreenderemos no céu, permite. E Deus os permite por ver, diferentemente de nós, muito mais além do que momento presente. Ele vê tudo do ponto de vista da eternidade.

Mas o que significa ser santo? Basicamente significa transformar-se em Cristo: 

"Completo na minha carne — diz o Apóstolo São Paulo, ao explicar o valor salvífico do sofrimento — o que falta aos sofrimentos de Cristo pelo seu Corpo, que é a Igreja". (Colossenses 1:24)

Mas o sofrimento de Cristo foi perfeito. O que São Paulo queria dizer com "completo" o sofrimento de Cristo?

Bom, o nosso caminho de santidade se traduz na expressão de Cristo em nós. Conforme nos santificamos, "morremos" para que Cristo apareça, de modo que possamos dizer como São Paulo: "Eu vivo, mas já não sou eu; é Cristo que vive em mim." (Gálatas 2:20) Assim, ser santo é transformar-se em Jesus, e transformar-se inclusive no sofrimento e na entrega. 

A compreensão da importância do sofrimento nos ensina porque a morte de Jesus, ao invés de uma brutal execução, foi um sacrifício de amor. 
Antes de morrer, na quinta-feira santa, Jesus se entregou (dando-se por nós através do Sacramento da Eucaristia) e, ao se entregar, transformou o que seria simplesmente uma sentença de morte injusta em um sacrifício, cumprindo a vontade do Pai.
Na antiga aliança, Abraão, seguindo a vontade de Deus, entregou a Isaac por um sacrifício por amor a Deus. Ali, mais que um pai cumprindo a vontade divina, temos também um filho que, fiel a vontade de Deus, oferece a si próprio. Vendo a adesão e o amor de pai e de filho, Deus faz com eles um aliança de amor e, revogando seu pedido pela vida de Isaac, pede a morte de um cordeiro, símbolo dessa aliança. 

Na nova aliança, novamente um Filho dá a si mesmo por amor. E assim, pelo sacrifício do Filho, que entrega a si mesmo, Deus estabelece com a humanidade uma nova aliança: Jesus Cristo é o cordeiro que tira o pecado do mundo. E nenhum sacrifico posterior a esse sacrifício perfeito é necessário.

Como completamos, então, o sofrimento de Cristo em nossa carne? O fazemos porque é o próprio Jesus que nos permite, ao fazer de nós o seu corpo, que é a Igreja, pelo batismo. É somente à luz da dimensão da Igreja Corpo de Cristo, que se desenvolve continuamente no espaço e no tempo, é que se pode pensar e falar "daquilo que falta" aos sofrimentos de Cristo. São Paulo ressalta-o claramente quando fala da necessidade de completar "aquilo que falta aos sofrimentos de Cristo pelo seu Corpo, que é a Igreja".

"Se um homem se torna participante dos sofrimentos de Cristo, isso acontece porque Cristo abriu o seu sofrimento ao homem, porque Ele próprio, no seu sofrimento redentor, se tornou, num certo sentido, participante de todos os sofrimentos humanos. Ao descobrir, pela fé, o sofrimento redentor de Cristo, o homem descobre nele, ao mesmo tempo, os próprios sofrimentos, reencontra-os, mediante a fé, enriquecidos de um novo conteúdo e com um novo significado." (Salvifici Doloris)

Deus permite que você sofra para possa repetir a vida de seu Filho na sua. Eis aí o propósito do sofrimento na sua vida. Se você aceita a Jesus, deve aceitar Seu sofrimento. E será a forma com que aceita seu próprio sofrimento o que te converterá em santo. 

Se, além de aceitarmos as nossas penas, as entregamos e oferecemos os nossos sofrimento a Deus, temos nas mãos uma grande oportunidade de participarmos não só da dor de Cristo, mas também do seu mistério Redentor: "A Cruz de Cristo projeta a luz salvífica de um modo assim tão penetrante sobre a vida do homem e, em particular, sobre o seu sofrimento, porque, mediante a fé, chega até ele juntamente com a Ressurreição - o mistério da paixão está contido no mistério pascal. As testemunhas da paixão de Cristo são, ao mesmo tempo, testemunhas da sua Ressurreição." (Salvifici Doloris)

A Redenção operada por Jesus embora tenha sido realizada em toda a sua plenitude pelo Seu sofrimento, à sua maneira vive e desenvolve-se ao mesmo tempo na história dos homens. Vive e desenvolve-se como o Corpo de Cristo, que é a Igreja; e nesta dimensão, todo o sofrimento humano, em razão da sua união com Cristo no amor, completa o sofrimento de Cristo.

As almas, nos lembra a Madre Angélica, uma famosa freira carmelita americana, não são forjadas somente sorrisos e facilidades, mas com dor e dificuldades. 

Padre Pio, com sua grande sabedoria, nos ensinava que sem sofrimento não há salvação de almas: "Um dia, quando nos for dado ver a luz do meio-dia, então saberemos que valor, que tesouros terão sidos os sofrimentos aqui na terra que nos terão feito alcançar a pátria que não terá fim. Das almas generosas e apaixonadas por Deus se esperam o heroísmo e a fidelidade para chegar, depois da subida ao Calvário, ao Tabor".

Aliás, ele próprio, que se tornou de tal forma configurado a Cristo que recebeu na própria carne as chagas do Senhor, sofria com frequência e intensamente por cada alma que defendia contra o ataque do inimigo. 

Ser santo é isso: não fugir da dor, mas abraçá-la confiante de que Deus tem um propósito maior do que nós podemos enxergar e entregá-la nas Suas mãos, como um sacrifício de amor - o sacrifício e a cruz que são os únicos meios através dos quais nossas almas podem sem santificar.

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